2.11.2011

Descuido



Existem sempre coisas que se quebram. Vidro, pratos e unhas. Carros, contratos e batatas fritas. Podemos quebrar um recorde, quebrar a fúria bravia de um cavalo para o domar, quebrar um dólar em trocos. Podemos quebrar o gelo. Existem quebras no trabalho para fazer um intervalo para o café ou para almoçar, para se evadir da prisão. Quebrar-se a noite para ceder o lugar ao alvorecer, quebram-se as ondas, quebram-se as vozes. Podem-se quebrar as correntes. Também o silêncio e a febre.
Ao longo dos últimos dois meses da minha vida, fiz listas destas coisas, na esperança de tornar tudo mais fácil se um dia tornasses a voltar.
Quebraram-se as promessas.
Quebraram-se os corações.
Na noite antes de apareceres, fiquei sentada na cama com qualquer coisa para acrescentar à minha lista. Vasculhei na mesa-de-cabeceira à procura de lápis e papel, mas o silêncio colocou a sua mão quente e macia sobre a minha perna. «Charlotte?», perguntou. «Está tudo bem?»
Antes que pudesse responder, abraçou-me, encostou-me a ele, e adormeci sentindo-me segura, esquecendo-me de anotar o que sonhara.
Só passadas algumas semanas, quando já aqui estavas, é que me lembrei do que me tinha acordado naquela noite: falhas tectónicas. São os locais em que a terra se quebra e se divide. São os sítios onde se originam os terramotos, onde nascem os vulcões. Ou, por outras palavras: o mundo está a desmoronar-se por baixo de nós; o chão firme que pisamos é uma ilusão.
« Tudo pode quebrar. Mas algumas coisas doem mais do que outras. »


2 comentários:

Diogo Passos disse...

Está lindo amor *.*

adriana raquel disse...

escreves mesmo bem irma (: